É bastante comum acabarmos falando sobre signos no trabalho. Numa dessas, estávamos numa rodinha tagarelando sobre o assunto, até que chega uma colega pouco afeita ao tema.

“E você, fulana? Qual é o seu signo?”, perguntou a mais entendida. A colega fez uma cara de “ai, de novo” e disse meio cantando, meio irônica: “O futuro a Deus pertence.”

Demos risada, largamos o assunto e voltamos a trabalhar.

Obviamente, eu jamais esqueci a cena (e cá estou trazendo-a à tona de novo). “O futuro a Deus pertence”… É uma frase pra lá de verdadeira, mas naquele contexto, carregava algumas camadas de preconceito e ignorância.

Até porque ninguém estava falando que não pertencia, em primeiro lugar. Depois, estávamos bem longe de falar sobre o futuro: falávamos sobre personalidade, sobre autoconhecimento.

Ok, eu até entendo de onde veio o bode da nossa colega a respeito da astrologia – e diversos profissionais do ramo não ajudam em nada a mudar esse estigma. Horóscopos de jornal, de programas de TV, de rádio, de portais na internet fazem premissas vagas, beirando a autoajuda – e, sim, já ouvi a confissão de uma amiga jornalista de que ela inventava o texto do horóscopo na maior cara de pau.

Outro dia, naquelas TVs que ficam em alguns ônibus de São Paulo, até achei engraçada a mórbida coincidência e a forma como a mensagem ia direto ao ponto. Dizia: “Câncer: cuidado!” Ora: era um horóscopo ou uma campanha do Ministério da Saúde?

Sem contar que faz parecer que o mundo é dividido em doze tipos de pessoas, e com cada um desses grupos vai acontecer exatamente a mesma coisa naquele dia.

Se a astrologia fosse uma senhora, ela estaria morrendo de vergonha a uma hora dessas.

Os planetas, estrelas, satélites, cometas e tudo o mais que está nesse vasto universo nos ensinam muito mais do que se vamos encontrar um namorado na próxima semana. Aliás, me arrisco a dizer que essa é a parte mais rasa da astrologia.

Ao olharmos para os céus, ela nos faz enxergar a nós mesmos. Nos faz termos uma ideia mais clara de como funcionam nossas engrenagens, quais são maiores e mais fortes, quais enferrujam mais fácil. Nos faz perceber qual parte da máquina está meio emperrada e precisa de um pouco de óleo. Que peça está quebrada e, se substituída, ajudaria a movimentar todo o sistema.

Repare: ao valorizar o autoconhecimento, a astrologia avalia muito mais o passado do que o futuro. E até o passado é imprevisível. No calor do momento presente, pode ser que a gente simplesmente não enxergue com clareza uma série de circunstâncias. Com o distanciamento do tempo (e com a sabedoria que ele proporciona), os acontecimentos ganham outras nuances – e isso ajuda a perceber melhor o momento presente.

Sim, a astrologia também se presta a fazer previsões. Mas a coisa é bem diferente do que o tal horóscopo das páginas dos jornais. Perto da complexidade do mapa astral, o signo solar de uma pessoa (aquele que descobrimos a partir do dia e mês de nascimento) vale bem pouco. E mesmo sabendo todos os detalhes astrais de uma pessoa e fazendo uma previsão precisa, ainda existe um detalhe fundamental e irrevogável: o livre arbítrio. Os astros mostram uma tendência, mas a pessoa tem toda a prerrogativa de usar seu conhecimento para transcender. Afinal, se tudo já estivesse definitivamente escrito em pedra, qual seria o sentido de darmos continuidade à existência?

E no fim das contas, embora não seja exatamente com o tom pejorativo que a tal colega falou, ela até estava certa: o futuro a Deus pertence.

Nós só ajudamos a desvendá-lo.

E quem foi que disse que a astrologia não pode ser uma das inúmeras maneiras que Ele encontrou para se comunicar conosco?